Artigo do presidente da CNI: “A desoneração de que as empresas precisam”

28/01/2019   11h42

Em artigo publicado nesta segunda-feira (28.01) no jornal Estadão, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, explica que o custo de mão de obra é composto por diversos encargos. E o que é pago para o Sistema S está entre os menores

 

A superação do dramático quadro de desemprego que assombra o Brasil é um dos grandes desafios do novo governo. Como mostram pesquisas recentes, a população está otimista, acreditando que dias melhores estão por vir. Mas emprego, como se sabe, não se cria por lei ou decreto. É preciso uma conjunção de fatores e medidas bem articuladas.

 

A redução da contribuição destinada pelas empresas a entidades como o Serviço Social da Indústria (SESI) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Nacional (SENAI)certamente não é uma delas. Aliás, pode trazer efeitos contrários aos pretendidos.

 

O corte na alíquota incidente sobre a folha de pagamento viria, como sinalizam algumas autoridades deste governo, num pacote de desoneração da iniciativa privada, que ficaria aliviada, em parte – nesse caso, ínfima -, de sua carga tributária. Com isso, esperam, haveria a retomada da criação de empregos.

 

A mira, no entanto, parece estar desajustada. Eventuais cortes nos recursos de entidades como SESI e SENAI atingiriam justamente a principal rede que cuida da qualificação profissional, da saúde e da segurança dos trabalhadores no Brasil. Os efeitos seriam danosos, sobretudo, para a preparação de mão de obra qualificada, fundamental para aumentar a baixa produtividade no País e também para fazer frente aos desafios da quarta revolução industrial, que já está em curso.

 

O custo de mão de obra compõe-se de diversos outros encargos além do salário, como INSS, RAT, salário-educação, FGTS, além dos direitos trabalhistas, verbas rescisórias, etc. Os custos do Sistema S estão entre os menores. Além disso, sua atuação traz enormes e inegáveis benefícios para as empresas e para os trabalhadores.

 

Note-se que, na folha salarial, o custo do INSS é de 20% sobre o salário; o do FGTS, 8%; o do salário-educação, 2,5%; e o do RAT (combinado com o FAP) pode chegar a 6 %. Além disso, feriados custam cerca de 4,34% dos valores dos salários por ano; aviso prévio indenizado (considerando rotatividade média de um ano), 10,86%; multa rescisória de 40% do FGTS e adicional da LG110/01 nas dispensas sem justa causa, respectivamente, 2,1% e 1,31%. Sem falar nos impostos. As contribuições para o Sistema S custam menos que todos esses: 1,5% para SESI/Sesc, 1% para SENAI/Senac, além de 0,6% para o Sebrae.

 

Estudo publicado recentemente no blog do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV) demonstra que reduzir as contribuições ao Sistema S, como propõe o atual governo, teria efeito diminuto na queda do desemprego. Em resumo, o estudo sustenta que o corte proposto comprometeria severamente o importante trabalho desenvolvido pelas entidades que integram o Sistema S e não traria efeitos em termos de desoneração para criação de empregos.

 

Se a ideia é desonerar de maneira efetiva as folhas de salários das empresas, não faz sentido reduzir os repasses às entidades do Sistema S, pois o custo-benefício seria efetivamente muito baixo ou nulo, dado que as empresas teriam de lançar mão de outros recursos para qualificar seus empregados e promover a saúde e a segurança deles no ambiente de trabalho.

 

É reconhecido que o Brasil precisa de profissionais qualificados para preencher as vagas que têm surgido cada vez mais em decorrência das novas tecnologias advindas da chamada indústria 4.0. O SENAI desempenha importante papel na capacitação de profissionais, hoje 95% da mão de obra empregada na indústria é de egressos dessa entidade. Ainda assim, o País carece de mão de obra capacitada.

 

A isso se soma o papel social: 80% dos jovens técnicos formados pelo SENAI são das classes C, D e E. Além de capacitar e tomar viável uma profissão para a parcela mais carente da população, há significativos ganhos na empregabilidade e na qualidade do emprego no Brasil.

 

Portanto, se o objetivo é estimular a criação de empregos, é um contrassenso retirar recursos de entidades que promovem qualificação profissional, capacitação, aprendizagem e melhor qualidade de vida para o trabalhador. Na verdade, a desoneração deveria ter como mira os encargos trabalhistas que não trazem retorno direto ao trabalhador, isto é, oneram a folha de pagamento, mas o beneficio não é direto para o empregado, como a multa adicional de 10% sobre o FGTS.

 

Vale dizer que o SESI e o SENAI são instituições privadas, mantidas com recursos oriundos da própria indústria (artigo 240 da Constituição), modelo adotado por vários outros países, como França, Alemanha, Áustria, Finlândia, Inglaterra e Cingapura, onde se fixam porcentuais parecidos. Tais recursos retomam como serviços para as próprias indústrias, e para a sociedade em serviços como a já citada qualificação profissional, bem como ensino básico, inovação tecnológica e ações em prol da segurança e da saúde no trabalho industrial.

 

Importante destacar que apenas as médias e grandes indústrias contribuem com recursos para o SESI e o SENAI, beneficiando as pequenas e microempresas, que são as maiores geradoras de empregos no País.

 

No fim das contas, se tiverem resultado positivo nas taxas de ocupação em curto prazo, eventuais cortes nos recursos do Sistema S certamente impactarão negativamente na qualidade da força de trabalho em médio e longo prazos, e em outras ações de suma importância para a produtividade e para a competitividade do País.

 

O Brasil não pode prescindir das ações dessas entidades, que preparam milhões de pessoas para o mercado de trabalho. O governo deveria focar todas as suas energias e seu capital político para realizar uma profunda reforma da Previdência, que produziria, entre outros benefícios, impactos positivos nos custos das folhas de pagamento das empresas.

 

Outra prioridade deveria ser a simplificação e redução da carga tributária que onera as empresas e afugenta investimentos, impedindo a retomada do crescimento e a criação de mais e melhores empregos.

 

É dessa desoneração que as empresas precisam. Sem isso, o Brasil dificilmente sairá do atoleiro em que se encontra.

 

O artigo foi publicado nesta segunda-feira (28) no Estadão.