Artigo: Um país sem financiamento para crescer, por Robson Braga de Andrade

25/10/2021   13h00

Em artigo publicado no jornal O Globo, o presidente da CNI, Robson Andrade, destaca que os recursos do FNDCT são primordiais para a ciência

 

Desafios sem precedentes, como a pandemia da Covid-19, colocaram a ciência, tecnologia e inovação (CT&I) em evidência, como ferramenta imprescindível para a retomada do desenvolvimento econômico e social. Os países avançados compreenderam que o fortalecimento de seus ecossistemas de CT&I, com estímulo às inovações e integração entre pesquisa e mercado, é primordial para tornar a indústria mais digitalizada e competitiva, gerar empregos de qualidade, melhorar o meio ambiente e promover a inclusão social. O financiamento estimulante e previsível desse setor é o grande diferencial para que empresários inovadores consigam gerar vantagens competitivas e fazer a economia girar.

 

No Brasil, quando os Fundos Setoriais foram criados, no fim dos anos 1990, percebeu-se a necessidade de assegurar recursos estáveis para irrigar a inovação e o desenvolvimento científico e tecnológico. Eles tornaram-se a maior fonte das receitas do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), principal instrumento de financiamento às atividades de CT&I em empresas e instituições de pesquisa. Usufruíram os recursos do FNDCT companhias como Embraer e Embrapa, que imprimem a marca do Brasil inovador no mundo, além de tantas outras que desenvolvem pesquisa. Universidades e Institutos de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICTs) públicos e privados também se beneficiaram.

 

Nos últimos anos, porém, o orçamento do FNDCT não vem sendo aplicado no seu fim. Em 2020, de um total em torno de R$ 7 bilhões, menos de R$ 1 bilhão foi investido em projetos não reembolsáveis nas instituições de pesquisa e empresas, ao passo que R$ 4,2 bilhões foram contingenciados para pagamento da dívida pública. Em 2021, caminha-se para situação semelhante —apenas R$ 915 milhões, de um total de R$ 3,6 bilhões previstos, foram autorizados para investimento.

 

Em conjunto com instituições científicas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI) — movimento que reúne cerca de 500 executivos e CEOs — conseguiram que o Senado aprovasse uma lei para transformar o FNDCT em fundo contábil e financeiro, assegurando a aplicação dos recursos de forma imediata e integral, dentro de sua finalidade e sem contingenciamentos. Entretanto, em flagrante contraposição à nova lei, os recursos continuam pouco acessíveis. Seguindo orientação do Ministério da Economia, metade do orçamento do FNDCT este ano foi destinada a operações reembolsáveis da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), mas a cobrança da TJLP nos empréstimos tem inviabilizado a tomada de crédito.

 

O repasse da outra metade é sistematicamente adiado, como demonstra a recente aprovação do PLN 16/2021, que remanejou R$ 655 milhões do FNDCT para a cobertura de despesas de outros órgãos. Diante dessa realidade, não surpreende a perda de posição do nosso país em rankings internacionais, como o Índice Global de Inovação, em que caiu dez posições entre 2011 e 2021.

 

O Brasil precisa urgentemente adotar uma visão de longo prazo, em que a CT&I sejam o grande fator de inserção do país na economia do conhecimento. Da mesma forma, deve integrar políticas públicas para forjar a indústria do futuro, desenvolvendo tecnologias críticas para o enfrentamento dos grandes desafios do planeta: sustentabilidade, produção de energia limpa, acesso à saúde e à educação, segurança alimentar, redução das desigualdades, e geração de emprego e renda.

 

A fórmula para o Brasil avançar não pode ser diferente da traçada por países desenvolvidos, que outros — como China, Coreia do Sul e Índia — estão rapidamente adotando. Não podemos abrir mão do papel do governo como indutor do investimento privado, por meio da ação conjunta com o setor empresarial e a academia, para que o país volte a crescer e retome seu lugar como uma das mais importantes economias do mundo.

 

*Robson Braga de Andrade é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

O artigo foi publicado originalmente no dia 23/10, no jornal O Globo.