Ataque ao Sistema S é ‘falta de conhecimento’ , diz presidente da CNI

6/11/2018   12h47

 

O mal-estar entre a indústria e o economista Paulo Guedes, já anunciado como titular do futuro superministério da Economia, ganhou mais um capítulo com a informação de que ele pretende mexer no funcionamento do Sistema S. As primeiras fricções haviam surgido com o plano de extinção do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic) como pasta independente e com a ideia de um corte unilateral nas tarifas de importação. Em conversas sobre o Sistema S, Guedes tem dito que a solução é “privatizar” o que haveria de melhor nele, o Senai, segundo apurou o Valor.

 

Para o economista, o ensino técnico poderia ser assumido por um grupo de educação privado, que já atue com ensino básico e superior, e teria a formação técnica como complementar à grade. Guedes tem ressaltado a interlocutores o custo total dos serviços sociais autônomos e quanto efetivamente é investido em educação – apontando custo elevado em estrutura administrativa e publicidade, por exemplo.

 

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, afirmou que há “falta de conhecimento” sobre a atuação do Senai e do Sesi. Ele vê os ataques como produto de “desinformação” e garante que é exemplar a prestação de contas das duas entidades do Sistema S vinculadas ao setor industrial. “Há 100% de transparência”, disse Andrade ao Valor. “Não falo pelos demais, mas todos os contratos do Sesi e do Senai estão disponíveis na internet para qualquer um ver”, acrescentou.

 

Em referência aos amplos poderes de Guedes no governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro, o empresário já havia dito, em entrevista na semana retrasada, que o país não precisava de um “czar” para resolver os problemas da economia. De acordo com Andrade, o Senai e o Sesi são tidos como referências dentro do Sistema S pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Corregedoria Geral da União (CGU). Seus orçamentos, demonstrações contábeis e pareceres de auditorias independentes são públicos por meio de portais de transparência, disse.

 

Segundo ele, o Senai recebe anualmente 3,7 milhões de matrículas para qualificação profissional em cursos técnicos e de educação continuada. Dois navios-escola circulam pela Amazônia para oferecer cursos às comunidades ribeirinhas. O Senai dispõe ainda de 26 institutos de inovação. O Sesi, por sua vez, beneficia 1,2 milhão de estudantes por ano e atende a mais de 4 milhões de pessoas com serviços de segurança e saúde no trabalho. “Tudo isso custa caro.”

 

Andrade também fez uma defesa do recolhimento direto de encargos para financiar o Sistema S por indústrias com mais de 50 empregados. “Há uma decisão do plenário do TCU, jurisprudência do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e uma portaria da Receita Federal atestando a legalidade.” A arrecadação dos serviços sociais autônomos tem como base o recolhimento compulsório de 0,2% a 2,5% sobre a folha de pagamento das empresas. Um fenômeno recente tem sido a arrecadação direta, que não é feita pela Receita, mas recolhida pelos filiados da indústria ao Sesi e Senai. Isso ocorre, segundo Andrade, porque a Receita cobra 3% como taxa de administração para transferir os recursos ao Sistema S. “Ou seja, recolhemos R$ 100, e Sesi e Senai só recebem R$ 97”, afirmou.

 

Desde 2012, porém, a queda no número de trabalhadores empregados na indústria tem feito encolher os dois tipos de arrecadação. O Valor apurou que o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, prefere evitar declarações contrárias ao novo governo antes de uma conversa com Bolsonaro pessoalmente. A interlocutores, contudo, foi categórico: “Pelo Sesi e pelo Senac de São Paulo eu ponho a mão no fogo”. Na semana passada, em redes sociais, Skaf rebateu afirmação de Guedes de que salvaria a indústria “apesar dos industriais brasileiros”. “A indústria brasileira sobreviveu apesar dos governos. Isso sim é verdade”, disse.

 

Publicado no jornal Valor Econômico (06.11.2018)