Economia de baixo carbono: qual é o papel do hidrogênio sustentável nesse contexto?

7/10/2022   10h37

Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI Foto: André Albuquerque

 

Às vésperas da COP27, a conferência anual do clima da ONU, que acontece em novembro, no Egito, multiplica-se o uso de expressões como “economia de baixo carbono”, “descarbonização”, “hidrogênio verde” ou “transição energética”.

Em entrevista ao Indústria Verde, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Davi Bomtempo, explica de forma didática esses termos, fala como o Brasil está se organizando rumo a uma transição para uma economia de baixo carbono e como a produção de hidrogênio sustentável pode ajudar o país e o mundo a cumprir metas de redução de emissões assumidas.

 

 Você poderia começar explicando o que é uma economia de baixo carbono?

A economia de baixo carbono, em poucas palavras, é o país manter um determinado nível de produção e, ao mesmo tempo, reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Alguns países, regiões e mesmo empresas já ambicionam a neutralidade climática a longo prazo, mas precisamos, até 2030, reduzir e compensar as emissões, de forma a cumprir as metas climáticas. Isso já nos traria enormes benefícios.

 

Como essas reduções podem ser alcançadas?

Isso pode ser alcançado por meio de pilares que podem ser implementados. É possível trabalhar a transição energética, ou seja, trabalhar com combustíveis mais sustentáveis, combustíveis mais limpos; trabalhar projetos de eficiência energética e de biocombustíveis; investir em energias renováveis, como eólica, solar e biomassa. São caminhos que as empresas vêm utilizando para reduzir cada vez mais suas emissões.

A indústria apresentou sua estratégia para uma economia de baixo carbono, em 2021, apoiada em quatro pilares. O pilar da transição energética versa sobre a necessidade de utilizarmos combustíveis que emitem menos carbono em sua cadeia de produção; de apoiarmos projetos de eficiência energética para as plantas industriais energointensivas; e de investirmos em fontes renováveis como a eólica, solar e biomassa, e em novas tecnologias como a do hidrogênio e da captura e armazenamento de carbono (CCS).

 

Como a indústria está inserida nessa discussão, inclusive em âmbito internacional?

A indústria já investe em sustentabilidade há bastante tempo, pois sabe que, incorporada à sua estratégia, a sustentabilidade traz uma vantagem competitiva se comparada ao mercado internacional. Além disso, a indústria hoje precisa atender não só um arcabouço nacional e internacional, mas também atender o desejo do próprio consumidor, que hoje quer saber como as empresas vêm produzindo, ou seja, a quantidade de emissões, se há um programa de eficiência energética, um programa de eficiência hídrica, se trabalha com gestão de resíduos e se contempla também um cuidado com a sociedade que está ao redor da sua planta. Enfim, todas essas variáveis são consideradas na hora da escolha e como fator de competitividade na inserção da empresa brasileira no contexto internacional.

 

A indústria já está fazendo sua parte?

Com certeza. A indústria já identificou o desafio da transição para uma economia de baixo carbono como uma oportunidade para ampliar sua participação no mercado internacional, com produtos de valor ambiental agregado. A indústria analisa seu gasto com energia elétrica e térmica, identifica oportunidades de substituição ou aprimoramento da linha de produção com uso de menos recursos, trazendo o conceito de circularidade para a linha de produção e para a cadeia de fornecedores. Isso significa tratar o resíduo como um recurso para produção na mesma cadeia de valor ou em outras.

 

A indústria é parte da solução para alcançar a economia de baixo carbono?

Certamente a indústria vem fazendo a sua parte. Atualmente a participação da indústria em investimentos em pesquisa e desenvolvimento é de quase 70%. No entanto, para que possamos cumprir metas nacionais e regionais de redução das emissões de gases de efeito estufa, de forma mais estruturada e fortalecida, precisamos também de alinhamento e coordenação com outros atores, como a sociedade e o governo.

 

O que é o hidrogênio sustentável e por que se tem falado tanto nele?

A CNI está atenta à produção de hidrogênio de diversas fontes energéticas. O hidrogênio sustentável para a indústria abarca não somente o produzido a partir das energias renováveis, como também do gás natural com acoplamento da tecnologia de armazenamento e captura de carbono (CCS), para redução das emissões de carbono. O hidrogênio verde é produzido particularmente a partir das fontes eólica e solar. Há também o hidrogênio produzido a partir da biomassa ou biocombustíveis, classificado como hidrogênio verde musgo. O Brasil tem grande potencial de produção desse combustível, seja para consumo no mercado doméstico ou para exportação. Aliás a vantagem competitividade do Brasil para produção de hidrogênio tem colocado o país em posição estratégica nos planos de descarbonização de países europeus.

 

A CNI publicou recentemente um estudo sobre o hidrogênio sustentável. Qual é o seu papel na descarbonização?

 O hidrogênio sustentável está inserido na estratégia de descarbonização de vários países que se comprometeram com metas de redução das emissões de gases de efeito estufa por meio de acordos internacionais. Dado o avanço célere do processo de desenvolvimento da indústria de hidrogênio sustentável, são significativas as oportunidades para a indústria brasileira promover a descarbonização dos seus processos e a CNI pode ter um papel catalisador no engajamento da indústria para a descarbonização via hidrogênio. Desde 2021, foram anunciados 131 novos projetos de larga escala em hidrogênio, com investimentos previstos de cerca de US$ 500 bilhões até 2030. Esse montante é somente inicial. O Brasil tem potencial para receber ainda mais investimentos nessa área, gerando renda, empregos e ativando a economia das regiões próximas. O hidrogênio tem o potencial de colocar o Brasil como um dos grandes players nessa agenda e promover o desenvolvimento regional.

 

Como esse estudo da CNI vai ajudar o Brasil a avançar nessa agenda?

É o primeiro estudo a identificar oportunidades de negócios envolvendo o hidrogênio sustentável. Ele faz um mapeamento e estabelece algumas diretrizes para que possamos desenvolver essa agenda num nível doméstico, ou seja, para que possamos trabalhar todo um arcabouço regulatório para pavimentar o caminho para que o empresário brasileiro desenvolva o seu trabalho, implemente o seu empreendimento com segurança jurídica.

 

Como o hidrogênio sustentável pode ajudar o Brasil a alcançar essas metas de redução de emissões?

O hidrogênio sustentável é um pilar central, ele é uma agenda de muita importância para a economia brasileira. Do lado da oferta, o país dispõe de variados recursos renováveis (energia eólica, solar, etanol e hidráulica) para produção de hidrogênio, tanto via eletrólise quanto via reforma a vapor de gás natural, podendo ambas as rotas serem usadas para impulsionar seu desenvolvimento industrial. Ao lado da demanda, a posição geográfica e a dimensão continental do Brasil ampliam as possibilidades de o hidrogênio ser explorado tanto no mercado interno – na cadeia industrial e de transporte – quanto no externo, por meio de exportações especialmente à Europa. Portanto, parece bastante oportuno que o Brasil aproveite a conjunção desses fatores e passe também a promover políticas e estratégias de desenvolvimento da cadeia do hidrogênio sob o prisma da descarbonização da indústria nacional, das mudanças climáticas, da segurança energética, do crescimento econômico e dos benefícios ambientais e sociais associados a menores níveis de emissão de GEE.

 

Da Agência de Notícias da Indústria