Entrevista com o presidente da FIERN: “O RN precisa melhorar sua gestão”

13/11/2018   08h58

 

Equilibrar receitas e despesas não é uma tarefa fácil para a maioria da população brasileira. O endividamento assombra mais de 60 milhões de pessoas em todo o País, de acordo com dados mais recentes do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil). No âmbito dos governos Estadual e Federal, a situação é ainda pior em decorrência do tamanho da máquina pública administrada, dos bilhões de reais envolvidos e das centenas de milhares de servidores públicos que dependem dos salários para sobreviver.

 

O Rio Grande do Norte corre o risco de passar os últimos meses deste ano em situação econômica similar ou pior a já vivida nos anos de 2016 e 2017. O Governo do Estado necessita de, pelo menos, R$ 2,1 bilhões para entregar a gestão à próxima governadora, Fátima Bezerra, com quase todos os pagamentos quitados, incluindo o resto do décimo terceiro salário de 2017, os vencimentos de novembro e dezembro e o décimo terceiro deste ano. Sem fonte de recursos, a situação é considerada crítica.

 

Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (FIERN), Amaro Sales de Araújo, a saída para a situação atual está na implementação de um amplo ajuste fiscal, cujo objetivo seja o equilíbrio das contas públicas e a fomentação do desenvolvimento econômico do estado.

 

Esse será um dos temas abordados na próxima edição do Motores do Desenvolvimento do Rio Grande do Norte, com o tema: “Caminhos do Brasil e do RN na gestão pública”, a ser realizado no próximo dia 19, às 08h, na Casa da Indústria.

 

Do seu ponto de vista, qual a possibilidade de saída para o impasse tributário que vivemos no Brasil hoje e para a retomada do crescimento?

 

Para mim, a principal pauta para o Brasil discutir, nesse novo mandato, se chama ajuste fiscal. Ajuste fiscal passa por reforma da Previdência, reforma tributária, reforma do Estado enquanto novos procedimentos a serem adotados pelo ente e ajuste partidário que se chama reforma do Legislativo. Na hora em que tivermos um pontapé inicial dessas reformas, estaremos falando de mudanças. Mudanças de entendimento, de procedimentos e mudança de direção. É animador quando o governo (federal) fala nas reformas e entende que precisa cortar gastos. Eu vi em reportagem recente que o governo (federal) diz que foi gasto, no mês de outubro, R$ 40 milhões com cartão corporativo e que mais de cinco mil pessoas detém esse cartão. Ora, quando se tem mais de cinco mil pessoas gastando de forma desordenada, de forma desproporcional, no decorrer de um ano se terá quase R$ 1 bilhão em gastos. Quando o governo começa a se preocupar com essas pequenas despesas num horizonte onde as despesas do governo são inúmeras, isso nos anima. Porque eu acho que precisa atacar em todas as frentes do gasto público, preocupação e qualidade com esse gasto público. Se colocarmos o déficit que vai acontecer neste ano de 2018, próximo de R$ 1 trilhão quando somadas todas as rubricas, me anima o governo falar em cortar gastos. Agora executar… eu falo em nível nacional. O presidente eleito vem referendado pelo voto popular, fica mais fácil implementar essas reformas. Na hora que ele tem uma bancada, que saiu de 62 deputados federais do seu partido e dizem, hoje, já tem 300 deputados na base aliada, isso nos anima. Acredito que esse novo governo, quando se fala em ajustes, da preocupação com gasto público, vem com um pensamento diferente.

 

Quando a gente traz para a realidade do Rio Grande do Norte, quais são hoje os principais entraves para as indústrias locais?

 

A carga tributária é uma carga que o empresário sempre irá reclamar. O empresário, a população, sempre achará que está pagando mais. Mas quando você paga e recebe em benefício do Estado, se pensa: “Eu pago uma carga tributária altíssima, no campo nacional, mas se não há segurança, saúde e educação, o custo passa a ser o dobro”. Temos que fazer isso bancando esse custo. No Estado do Rio Grande do Norte, nós tivemos a presença da governadora eleita, Fátima Bezerra, na Federação, atendendo a um convite nosso, e o pensamento da governadora, segundo me confessou, é de fazer um ajuste fiscal no Estado também. Quando ela pensa em fazer esse ajuste, ela tem a preocupação com o gasto público, com a Previdência Social mesmo que ela não tenha feito esse registro, eu perguntei a ela porque é um assunto que não pode ser tratado somente a nível regional, mas com o poder central, com o novo governo. Ela tem essa preocupação e as empresas que fazem o Rio Grande do Norte sabem que o estado há muito tempo não tem investido na infraestrutura, nos recursos destinados ao desenvolvimento. A governadora tem uma certeza que, para a gente pode mudar esse quadro, precisamos de incentivos, de novas empresas que venham para o estado e fortalecer as empresas que já existem. Empresas de porte maior, nosso estado não tem. Geralmente, é formado por micro e pequenas empresas. Mas há essa consciência de que o novo governo também vai enfrentar. Vejo com preocupação a informação de que o governo Robinson Faria acena para o não pagamento do resto de 2017 e de 2018 (décimos e folhas de novembro e dezembro). Isso proporcionará um tremendo baque para a economia local. Esperávamos que pagasse, pelo menos, o restante de 2017 (décimo terceiro para quem ganha acima de R$ 5 mil) e parte dos recursos de 2018. Mas ele (o governador) já anunciou que não tem esse recurso. E eu já começo a me perguntar se vai ter dinheiro para pagar o salário de dezembro, que é pago em janeiro. É uma pergunta que temos que fazer ao novo governo. A entrada desses novos recursos que devem ser regulamentados.

 

Quais os reflexos do não pagamento em dia dos salários dos servidores?

 

Imagine que a indústria, o comércio e os serviços sofrem um deságio de entrada de dinheiro. Os setores esperam a entrada de R$ 1,2 bilhão que não entra nos cofres e no consumo do estado. Isso será um prejuízo enorme e irrecuperável. Quando se não consome, não consegue se recuperar depois. Não se come dois sanduíches só porque no dia anterior não se comeu. Com uma calça, uma camisa, se pode adiar uma compra. Principalmente o consumo de alimentação, não se recupera num dia seguinte.

 

Em relação ao PROADI, há alguma pleito específico para reformulação, modernização?

 

A governadora (Fátima Bezerra) nos acenou de que irá fazer um novo PROADI beneficiando os micro e pequenos empresários. Hoje, já existe um grupo de empresas que participa desse benefício fiscal. O benefício fiscal não entra no caixa das empresas como benefício para as empresas mas, sim, como benefício para a competitividade destas. Elas se tornam competitivas como mercado. Elas participam numa concorrência de mercado e as empresas que hoje tem esse benefício, têm empregabilidade. O novo PROADI será uma complementação. A governadora, inclusive, vai sugerir e ficou de escutar os empresários do setor industrial do estado.

 

O MAIS RN e Agenda do RN apontam números e setores que podem contribuir para a retomada do crescimento do estado. O próximo governo deve olhar mais atentamente para esses estudos?

 

Eu acredito que o Estado está apoiando empresas na área de energia, criando infraestrutura que, muitas vezes elas se instalam sem ter. Há uma preocupação com as linhas de transmissão que deve ser permanente. A governadora também disse que é um assunto que interessa ao Estado, pois ocupamos o primeiro lugar na geração de energia eólica e fotovoltaica. E que o reflexo dessa grande produção de energia possa chegar ao consumidor final, com preço menor, e também às indústrias que estão estabelecidas aqui no estado. É um pleito nosso, da Federação das Indústrias, que possa oferecer às empresas que aqui cheguem uma energia mais barata e competitiva. Nas indústrias, o custo com energia representa, depois da matéria e mão de obra, um custo bem acentuado. Principalmente na indústria de transformação.

 

O Rio Grande do Norte está ficando espremido entre o Ceará e a Paraíba em termos de desenvolvimento. Quais exemplos podem ser extraídos do estado paraibano pelo RN?

 

O Rio Grande do Norte precisa melhorar sua gestão. A Paraíba tem uma economia hoje que é mais pujante porque o Estado fez o seu dever de casa. E ajustou a economia da Paraíba ao modelo e à arrecadação do estado. O estado do Rio Grande do Norte tem grandes potencialidades, várias riquezas. Tem setores importantes da economia como o têxtil, a confecção, a mineração, o sal, o agronegócio, laticínios, setores de energias… Acredito que, o Estado fazendo a sua parte, o seu ajuste do número de servidores ativos para aposentados que hoje está 1 para 1 e deve ser 1 aposentado para 4 produzindo, a conta tem que ser diferente. Precisamos ajustar. De que forma irá ajustar, esta conta precisa ser feita pelo novo governo.

 

O elevado índice de comprometimento da Receita Corrente Líquida, em torno de 86% segundo o Tesouro Nacional…

 

É um grande desastre. E precisa ser corrigido. Quando foi lançado o MAIS RN em 2014, nós já alertávamos o Estado de que era precisa ser feito alguma coisa. Não só o Estado, mas os Poderes. Um ajuste nas contas do Estado. Isso já faz quatro anos e pouco foi feito. Eu diria que não traria a culpa para o governo que sai, mas para os governantes e instituições que não deram muita atenção para o que a FIERN alertou naquele momento. Acredito que agora, que o novo governo da governadora Fátima Bezerra, possa dar uma atenção especial a essa grande ferramenta de sinalização de como andam as contas do Estado. <

 

Em relação ao pacto entre os Poderes, como a FIERN analisa essa questão?

 

Eu fiz um pedido à governadora Fátima Bezerra, para que ela procure os chefes do MPRN, TCE, ALRN e TJRN, para poder contar, realmente, a situação do Estado e pedir uma aliança. Sem um pacto pelo desenvolvimento do Rio Grande do Norte, pouco será feito. Porque se cada um achar que o problema do ajuste fiscal do Estado está só no Executivo, aí realmente não iremos para canto algum. Todos precisam fazer ajustes. Eles sabem que precisam fazer. Quem arrecada é o Executivo, mas quem gasta são os Poderes. Eles sabem o que precisam fazer um compromisso público para que as pessoas possam dar uma contribuição. Nós lançamos esse apelo.

 

A 36º edição do Seminário Motores do Desenvolvimento, com o tema “Caminhos do Brasil e do RN na gestão pública”, será realizado no dia 19 de Novembro de 2018, no Auditório Albano Franco, na Casa da Indústria/Fiern. Inscrições pelos telefones 4006-6120 ou 4006-6121 em horário comercial.

 

Entrevista ao repórter Ricardo Araújo (Tribuna do Norte – 13.11.2018)