Artigo – “É hora de virar a página”, por Roberto Serquiz

2/12/2025   15h04

Roberto Serquiz, industrial, Presidente do Sistema FIERN

 

Vivemos um momento de profunda inquietação. A sensação de que estamos passando por uma troca de valores é evidente: princípios antes sólidos parecem se dissolver, enquanto comportamentos que fragilizam a convivência democrática ganham espaço. O descompasso entre os poderes da República, longe de contribuir para o bem-estar da população, tem alimentado um ambiente de rivalidade permanente, em que prevalece o espetáculo longe dos reais problemas.

 

Nesse cenário, a política brasileira tem deixado de ser um instrumento de transformação coletiva para se tornar um campo de torcidas organizadas. Discute-se menos o conteúdo das propostas e mais a identidade dos nomes que as representam. O debate público, empobrecido, passa a orbitar em torno de personalidades, e não de ideias — e isso compromete diretamente a qualidade da nossa cidadania. Cidadãos transformados em torcedores perdem a capacidade de cobrar políticas efetivas e passam a defender indivíduos, independentemente de seus resultados.

 

Ao mesmo tempo, assistimos à transformação de uma parcela expressiva da população em dependente crônica do Estado.

 

Não por incapacidade individual, mas por um sistema que, ao longo dos anos, não estimula “portas de saída”. A assistência social, embora necessária em situações emergenciais, torna-se prejudicial quando se converte em estratégia permanente. Ela alivia a dor do presente, mas rouba a possibilidade de um futuro diferente.

 

É urgente virar essa página. E isso exige que busquemos referências em modelos que deram certo: nações que conseguiram equilibrar desenvolvimento econômico, inclusão social e estabilidade institucional. Esses países não avançaram por improviso, mas por planejamento. Estabeleceram políticas de Estado — não de governo —, investiram de forma contínua em educação, tecnologia e infraestrutura, simplificaram estruturas burocráticas e fortaleceram suas instituições democráticas. O resultado foi um ambiente em que as pessoas encontraram oportunidades reais de crescer e participar.

 

No Brasil, precisamos retomar essa ambição. Colocar o cidadão no centro significa substituir o personalismo por propostas concretas, a improvisação por planejamento e a dependência por autonomia. Significa recuperar a capacidade de diálogo, fortalecer o debate público, exigir transparência e cobrar compromisso. E, acima de tudo, compreender que a política é um espaço de construção, não de idolatria.

 

A mudança que tanto desejamos não começará de cima para baixo, mas do amadurecimento coletivo da sociedade. Quando deixarmos de torcer por nomes e passarmos a defender projetos, quando substituirmos a reação emocional pela análise racional, daremos o primeiro passo para um país mais estável, mais justo e mais digno.

 

Virar a página não é apenas um desejo — é uma necessidade urgente para que possamos, enfim, escrever um futuro em que o cidadão, e não o jogo de poderes, seja a verdadeira prioridade.