Acordo com a União Europeia é crucial para a reindustrialização do Brasil, diz presidente da CNI

4/05/2023   14h00

 

O acordo entre o Mercosul e a União Europeia (UE), concluído em junho de 2019, após duas décadas de negociações, representará um novo marco na inserção competitiva internacional da indústria brasileira. Sua entrada em vigor será uma contribuição importante para a reindustrialização do país, sem a qual nossa economia continuará indefinidamente em um ciclo de estagnação ou de baixo crescimento. Por isso, é urgente avançar em direção à assinatura do tratado em seu formato atual, sem a reabertura das negociações comerciais. Essa deve ser uma prioridade do governo.

 

Para que comece a valer de fato, o acordo ainda precisa passar por algumas etapas para compatibilizar legítimos objetivos nas áreas de sustentabilidade e proteção ambiental com compromissos equilibrados, levando em conta as condições socioeconômicas diferenciadas entre os países dos blocos.

 

Neste ano, temos uma oportunidade ímpar para fazer o trabalho que resta, aproveitando a presidência do Conselho da UE pela Suécia, no primeiro semestre; e pela Espanha, no segundo. Os dois países são firmes apoiadores do tratado, tendo amplas condições de impulsionar os trâmites necessários à assinatura e à ratificação, pelas instituições europeias, dos componentes comerciais e políticos firmados.

 

Conjugando um mercado consumidor de quase 720 milhões de pessoas e cerca de 20% da economia global, o acordo formará uma das maiores áreas de livre comércio do planeta. Ele contribuirá para a retomada da relevância da indústria na pauta comercial brasileira com a União Europeia, que foi o nosso segundo parceiro comercial em 2022, com uma corrente bilateral de mais de US$ 95 bilhões.

 

O acordo também contribuirá para a diversificação das nossas exportações, que são fortemente dominadas por bens primários de menor valor agregado. A concentração geográfica também é preocupante.

 

Dados oficiais apontam que, entre 2002 e 2022, as exportações brasileiras deixaram de ter no mercado europeu seu principal destino e passaram, cada vez mais, a ter foco na China. Nesse período, a participação da UE nas nossas vendas externas caiu de 23% para 15%, enquanto a parcela chinesa cresceu de 4% para 27%.

 

Apenas 22% do que vendemos ao mercado chinês, em 2022, correspondia a bens da indústria de transformação – em contraste, esses produtos responderam por 49% de tudo o que o Brasil exportou para o bloco europeu no ano passado. Aumentar o comércio com a UE, com destaque para os produtos industriais, significa fomentar a criação de empregos formais.

 

As vendas brasileiras para a União Europeia contribuíram com a geração de 21,4 mil vagas por bilhão de reais exportados em 2022 – valor significativamente maior do que a contribuição dos embarques do Brasil com destino à China (15,7 mil empregos).

 

Por isso, estamos confiantes de que o acordo com os europeus vai dinamizar os segmentos que têm um grande efeito multiplicador na economia, particularmente a indústria. Como o setor industrial é o que paga os melhores salários, o tratado também tende a melhorar a renda média do país. Uma vez que passe a vigorar, será o instrumento mais ambicioso negociado pelo Mercosul em mais de três décadas de existência e o mais moderno já assinado pelo Brasil.

 

No texto negociado com a UE, há dispositivos favoráveis ao desenvolvimento econômico sustentável do país, prevendo amplos benefícios, que vão além de uma agenda de redução tarifária equilibrada. Com sua entrada em vigor, a tendência é de diminuição dos custos de insumos e de aumento da demanda europeia por nossos produtos de maior valor agregado. As empresas nacionais passarão a ter mais acesso ao mercado europeu de bens, serviços e compras governamentais.

 

Nossas estimativas são de que cerca de 40% de todos os produtos ofertados pela União Europeia no acordo – e que estão sujeitos a algum tipo de tarifa em suas aduanas – deixarão imediatamente de ter a cobrança do imposto de importação ao entrar no bloco europeu.

 

Se os compromissos já valessem em 2022, isso equivaleria a quase R$ 13 bilhões em exportações brasileiras à UE. Desse valor, 99% correspondem a produtos da indústria de transformação.

 

O acordo também viabiliza uma agenda de diálogo, cooperação e articulação política entre os dois blocos em áreas estratégicas como segurança, meio ambiente, energia e mudanças climáticas. Hoje, a última grande pendência à sua celebração final é a negociação de um instrumento adicional detalhando as regras na área do desenvolvimento sustentável. A indústria brasileira defende que esse texto deva reforçar os termos já presentes no capítulo sobre o tema, sem gerar novos compromissos que comprometam o equilíbrio alcançado.

 

Essa parceria com a União Europeia traz evidentes benefícios à nossa economia: diversificação das exportações, estímulo à competitividade dos produtos brasileiros no mercado externo, cooperação para a transição energética e fomento à geração de empregos. Por tudo isso, sua conclusão formal é mais do que uma prioridade para melhorar a integração internacional do Brasil: é essencial para o desenvolvimento econômico, de forma competitiva e sustentável, do nosso país.

 

*Robson Braga de Andrade é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)O artigo foi publicado no jornal O Estado de S.Paulo em 03/05/2023.