CNI aponta as bases da economia verde

1/11/2022   11h19

Confederação Nacional da Indústria (CNI) entende que a transição para uma economia verde e de baixo carbono passa por quatro pilares principais: a transição energética para fontes limpas, a regulamentação do mercado de carbono, a estimulação da economia circular e a conservação das florestas.

 

Embora já existam iniciativas em andamento nessas quatro áreas, é preciso planejar os próximos passos e intensificar as ações para fortalecer os marcos legais, apoiar as empresas e engajar os consumidores e a sociedade na implementação de um modelo econômico sustentável e eficiente.

 

Veja a seguir como cada um dos quatro eixos pode ser fortalecido: 

 

A busca pela energia limpa

 

A transição energética é peça-chave na corrida mundial para reduzir a emissão de gases de efeito estufa e alcançar a neutralidade climática. Por essa razão, a ampliação do uso de energia proveniente de fontes renováveis é um dos quatro pilares da estratégia da CNI para consolidar uma economia de baixo carbono no país.

 

Os números mostram que, atualmente, o Brasil está mais bem posicionado nesse quesito do que a maioria dos países. Em 2021, 47% da matriz energética brasileira provinham de fontes renováveis. Nos membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), esse percentual era de 11% em 2019. Considerando apenas a matriz elétrica, as fontes renováveis representavam 84%.

 

As bases da  economia verde

 

Para permanecer em vantagem nesse processo de transição energética, a CNI propõe a expansão do uso das fontes renováveis. Uma das melhores opções a longo prazo é o uso do hidrogênio verde, tecnologia que reduz em até 90% as emissões de gás carbônico.

 

Outra proposta é aproveitar os mais de 8.000 km de costa litorânea do país, onde sopram ventos constantes e unidirecionais, para implantar parques de energia eólica em alto mar. Nesse sentido, a CNI propõe ao governo que sejam definidas regras mais claras e eficientes para o licenciamento ambiental e a criação de um marco legal do setor.

 

“O interesse em produzir energia a partir da força do vento tem aumentado significativamente no Brasil, mas ainda é preciso avançar nas discussões do arcabouço legal para trazer segurança jurídica ao investidor”, explica o gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo.

 

Eficiência energética

 

Para tornar o consumo mais eficiente na indústria, a entidade defende um maior direcionamento dos recursos dos programas de eficiência energética existentes no país para a indústria.

 

Iniciativas como o Programa Aliança, executado pela CNI em parceria com a Eletrobras e a Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), mostram que é possível aumentar os ganhos de eficiência energética por meio da otimização de processos, mesmo sem a substituição de equipamentos na linha de produção da planta industrial.

 

Outro mecanismo necessário para a transição energética é fortalecer a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e incentivar economicamente o reaproveitamento de resíduos sólidos para a geração de eletricidade e calor para a indústria, diz a CNI.

 

Mercado de carbono pode girar US$ 3 trilhões

 

O Brasil pode movimentar até US$ 3 trilhões em investimentos e venda de créditos de carbono ao longo dos próximos 30 anos. Os números são do estudo Seizing Brazil’s Climate Potential, em português Aproveitando o potencial climático do Brasil, da consultoria Boston Consulting Group. O documento aponta que o Brasil poderá captar entre US$ 2 trilhões e US$ 3 trilhões nas negociações desse mercado.

 

Para a CNI, a promoção e regulação dessas transações é de extrema importância para o país, que pode se tornar um grande exportador de créditos de carbono. A instituição enxerga o tema como um dos quatro pilares necessários para a transição do Brasil para uma economia de baixo carbono.

 

 

Atualmente, a oferta brasileira de créditos de carbono corresponde a cerca de 12% das emissões mundiais no mercado voluntário, aponta mapeamento feito pela Câmara de Comércio Internacional (ICC Brasil), em parceria com a WayCarbon. O país pode atender 48% da demanda global até 2030, segundo o relatório.

 

O ambiente regulatório e institucional é extremamente relevante para que a previsão de investimentos se concretize. Em maio, o governo brasileiro publicou o Decreto 11.075, conhecido como “decreto do mercado de carbono”, que cria algumas diretrizes para as negociações.

 

Em âmbito internacional, um dos principais destaques da COP26, realizada em Glasgow, ano passado, foi o acordo no âmbito do Artigo 6, último item necessário para finalização do Livro de Regras do Acordo de Paris. Em síntese, o Artigo trata dos mecanismos para criação de um mercado global de carbono.

 

A comercialização de créditos de carbono é oportunidade para descarbonizar as operações das empresas e ganhou impulso com a COP26, realizada em Glasgow

 

No Brasil, nas discussões sobre o mercado de carbono doméstico, a CNI defende a adoção de um mercado regulado, na forma de um Sistema de Comércio de Emissões (SCE), sob a ótica cap and trade, no qual empresas com volume de emissões inferior ao autorizado podem vender o excedente para as que lançam uma quantidade maior de gases de efeito estufa na atmosfera. A instituição acredita que o sistema estimulará novos negócios e investimentos, gerando emprego e promovendo inovação com transferência de tecnologia.

 

“O mercado voluntário de carbono e o regulado não são excludentes, mas, sim, complementares. O mercado regulado tem uma qualidade alta, com transparência e rastreabilidade. Tudo é muito claro. Ele terá um volume de negócios muito superior”, afirma Davi Bomtempo, da CNI.

 

A Engie Brasil, maior empresa privada de energia do país, é uma das corporações que já aproveita as oportunidades desse novo mercado. Além de vender créditos de carbono, neste ano ela se tornou a primeira companhia a vender digitalmente certificados internacionais de energia renovável, títulos que comprovam que a eletricidade consumida é proveniente de fontes renováveis.

 

“Oferecemos uma solução efetiva para as empresas se tornarem mais sustentáveis, mesmo se não tiverem Inventário de Carbono”, acrescentou Gabriel Mann, diretor de comercialização da empresa, em entrevista ao portal Indústria Verde.

 

Economia circular estimula negócios

 

A sola dos chinelos fabricados pela empresa cearense Malibu, de Juazeiro do Norte, é feita com PVC 100% reciclado. Em um ano, são reaproveitadas 600 toneladas do material na produção dos calçados. Dessa forma, a indústria evita o despejo de petróleo no meio ambiente e prolonga a vida útil de sua matéria-prima.

 

O modelo adotado pela Malibu é o da economia circular, um dos quatro pilares da estratégia da CNI para a consolidação de uma economia de baixo carbono. O conceito está fundamentado em uma menor dependência de matéria-prima virgem, priorizando insumos mais duráveis, recicláveis e renováveis.

 

Economia circular surge como forma de promover a gestão estratégica dos recursos naturais e geração de valor

 

Para a CNI, é preciso ampliar os investimentos em iniciativas que promovam a gestão estratégica, o mapeamento e o rastreamento dos recursos, o investimento em pesquisa, o desenvolvimento e a inovação tecnológica e a conscientização da sociedade para o melhor uso dos recursos naturais.

 

A indústria brasileira defende que seja definida uma política nacional capaz de promover a gestão estratégica dos recursos naturais, de maneira regulamentada, para orientar estados e municípios e engajar os setores público, privado e a sociedade.

 

Uma das soluções propostas pela entidade, que pode gerar resultados a curto prazo, é usar o poder de compra do Estado para estimular práticas de economia circular. As compras governamentais movimentam de 10% a 15% do PIB nacional.

 

Incorporar requisitos de sustentabilidade aos processos de compras públicas pode acelerar a descarbonização da economia. A CNI também entende que o estímulo deve ser acompanhado de um programa de desenvolvimento de fornecedores para incluir mais atores no processo.

 

Ecodesign, compras sustentáveis, simbiose industrial, reúso, manutenção, remanufatura, logística reversa, reciclagem e recuperação energética são alguns exemplos de práticas que contribuem para o desenvolvimento da economia circular.

 

Ecodesign, compras sustentáveis, reúso e reciclagem são exemplos de instrumentos da economia circular

 

Para o professor da Universidade de São Paulo (USP) Aldo Ometto, não há setor produtivo que não possa integrar a economia circular.

 

“Pelo contrário, é necessária a atuação conjunta de todos os setores porque os negócios começam a ser muito mais transversais, com novas formas de gerar valor”, diz ele.

 

Para Ometto, processos como a digitalização, a virtualização e a transformação de serviços em produtos impõem esse novo modelo de atuação.

 

Pesquisa realizada em 2019 mostrou que 76,5% das empresas já desenvolviam alguma iniciativa de economia circular. Entre as principais ações praticadas pelas empresas estavam a otimização de processos (56,5%), o uso de insumos circulares (37,1%) e a recuperação de recursos (24,1%).

 

O compromisso de conservar florestas

 

O desmatamento ilegal promove uma série de desequilíbrios na natureza e na economia que impactam a segurança hídrica e energética, a produção agropecuária, a atração de investimentos, a inserção de produtos nacionais no mercado externo e o acesso a financiamento. Por isso, a conservação florestal é fundamental para a estabilidade mundial e um dos quatro pilares da estratégia da CNI para promover a descarbonização da economia.

 

Manter florestas em pé, implementar o código florestal e incentivar a bioeconomia são essenciais para a economia verde

 

O Brasil tem 58% de seu território coberto por matas e o objetivo da indústria brasileira é envolver a sociedade, de forma efetiva, na proteção à vegetação nativa, com incentivos econômicos adequados, orientados pela pesquisa e inovação.

 

A CNI defende a implantação de três ações estratégicas para potencializar o combate ao desmatamento ilegal. A primeira delas é promover a expansão das áreas de concessões florestais. Esse modelo de gestão proporciona desenvolvimento para comunidades locais e facilita o controle e o acompanhamento da produção florestal madeireira.

 

O segundo ponto é a implementação do Código Florestal. Mesmo em vigor há dez anos, a lei ainda não foi devidamente implementada. O Cadastro Ambiental Rural (CAR), que é o primeiro passo para a obtenção da regularidade ambiental do imóvel, ainda precisa passar pela fase de análise e validação das informações inseridas pelos proprietários rurais.

 

Conservar florestas gera retorno econômico, como no manejo florestal sustentável e na bioeconomia, além de contribuir para um meio ambiente equilibrado

 

A terceira ação defendida pela indústria é impulsionar a bioeconomia, entendida como a geração de renda e riqueza, a partir do desenvolvimento de produtos derivados de recursos da biodiversidade, mediante o uso de tecnologias inovadoras. Para a CNI, o país precisa expandir sua rede de inovação e adequar-se aos acordos internacionais relacionados à biodiversidade.

 

“O setor de base florestal brasileiro é responsável por cerca de 3,5% do PIB do Brasil e por 7,3% das exportações totais do país, respondendo também pela geração de 7 milhões de empregos. Entretanto, mesmo com uma participação significativa na economia nacional, ainda existe espaço para a ampliação da produção e da agregação de valor dos produtos florestais”, destaca o documento Propostas da Indústria para as Eleições 2022, elaborado pela CNI com base em dados de 2007, e entregue a todos os então candidatos à presidência da República em junho deste ano.